Quarto Semestre de Jornalismo (2010)
OBJETIVIDADE JORNALÍSTICA: UM CONCEITO SUBJETIVO
1. INTRODUÇÃO
O estudo da Teoria da Comunicação envolve mais do o estuda da emissão e recepção das mensagens, está em mostrar o impacto da comunicação na sociedade. O tema abordado neste trabalho é um dos mais discutidos pelos estudiosos, pelo mistério que existe sobre a Objetividade Jornalística, um conceito formatado pelos mandatários da mídia e desmentido por alguns teóricos. O objetivo deste texto é mostrar os vários pontos de vista e discutir com os futuros profissionais este conceito importante, que muda a visão sobre o jornalismo, principalmente na questão da objetividade.
Para a realização deste trabalho, a agência In Locco Comunicação baseou-se na pesquisa de livros de teóricos brasileiros: Felipe Pena com Teoria da Comunicação e Sylvia Moretzsonh com Jornalismo em “tempo real”: O fetiche da velocidade, ambos docentes da Universidade Federal Fluminense e nas entrevistas realizadas com dois jornalistas: Paula Martim, repórter da Rádio Você AM 580 de Americana e Wilson da Costa Bueno, docente da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo.
1.1 Conceito
O conceito da objetividade no jornalismo nos tempos modernos iniciou-se em 1830 com uma pesquisa feita pelo ex-editor da rede de TV americana CNN, David Mindich, autor do livro Just the facts: how objectivity came to define american journalism, porém sua aplicação ocorreu somente no começo do século XX no jornalismo norte-americano. Criada pelos empresários da mídia com a intenção de passar uma imagem de credibilidade, o objetividade separa os fatos das opiniões, ligando-se com a Teoria do Espelho. Usando novos critérios, uma nova metodologia de praticar o jornalismo, que vinha sofrendo descrédito devido aos textos jornalísticos fortemente opinativos praticados na época.
Este é o conceito que está implícito nas pessoas que não têm o conhecimento dos estudos teóricos. Contradizendo este ponto de vista da objetividade, o livro Teoria do Jornalismo mostra: “A objetividade é definida em oposição à subjetividade, o que é um grande erro, pois ela surge não para negá-la, mas sim por reconhecer a sua inevitabilidade.” (PENA, 2006, p. 50). Mostrando que a subjetividade está presente por ser inevitável no jornalismo, sendo uma característica da objetividade, consistindo assim um mecanismo para amenizar a presença do subjetivo, mesmo pensamento defendido pela entrevistada Paula Martim: “É impossível pensar em algo totalmente objetivo, nós não somos seres objetivos, somos seres subjetivos, porém a profissão vem para esse contraponto, à busca da objetividade com a impossibilidade de sermos objetivos”.
Prosseguindo neste ponto de vista PENA (2006, p.50) diz que “[...] os fatos são construídos de forma tão complexa que não se pode cultuá-los como a expressão absoluta da realidade [...]”, por isto que a objetividade jornalística é considerada um mito.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 Ser Objetivo
A subjetividade está presente no processo jornalístico, pois os fatos que movem o jornalismo são subjetivos, visto que sofrem interferência dos indivíduos – subjetivos na sua construção.
A objetividade, então, surge porque há uma percepção de que os fatos são subjetivos, ou seja, construídos a partir de uma mediação de um individuo, que tem preconceitos, ideologias, carências, interesses pessoais ou organizacionais e outras idissossincrasias. (PENA, 2006, p.50)
O entrevistado Wilson da Costa Bueno aponta algumas características dos indivíduos através de quatro pontos: a linha editorial do veículo que o jornalista trabalha, a pressão de interesses: comerciais, pessoais, políticos, os compromissos e as visões particulares das fontes que subsidiam a cobertura do fato, e os filtros estabelecidos pelos próprios jornalistas, citado pelo entrevistado como “senso comum”.
As características do individuo citadas pelo Felipe Pena e Wilson da Costa Bueno estão implícitas, não deixarão de existir. A necessidade de amenizar a influência da subjetividade nos relatos fez-se criar uma metodologia de trabalho, ligando com a Teoria do Newsmaking, sendo uma técnica para que o fato fosse relatado com a realidade da Teoria do Espelho, que tem suas difusões. “[...] era preciso que os jornalistas evitassem os próprios preconceitos e a única maneira de fazer isso era adquirindo um pouco de espírito científico.” (PENA, 2006, p.51).
2.2 Quem é Objetivo?
‘Que é objetivo?’ Essa é uma pergunta comum no mundo do jornalismo, em que vários profissionais de experiência na área comentam que o seu jornalismo é objetivo, que o seu texto é objetivo. Mas esta analise não se limita apenas ao profissional, ela se estende também ao veiculo de comunicação. Os empresários da mídia comentam que o seus veículos são imparciais, como declarou Richard Salant, presidente do canal norte-americano CBS News.
Nossos repórteres não cobrem notícias sob o ponto de vista deles. Eles apresentam a partir do ponto de vista de ninguém. Com todo respeito, Mr. Salant, “ninguém” só pode ser o senhor mesmo. (PENA, 2006, p.52)
Porém está errado em afirmar que o jornalista ou o veiculo é objetivo. No capítulo anterior a abordamos feita é de que a objetividade está ligada a técnica de fazer jornalismo, não ao profissional, um equivoco que cometemos a fazer esta ligação. MORETZSOHN (2002, p. 110) observa que o discurso de que a atividade jornalística é profissional e objetiva serve como apenas referendar a imagem da empresa, ligando na credibilidade criada no inicio da objetividade.
Outro paradigma sobre a objetividade é a forte ligação que tem sobre o texto jornalístico, que para muitos é considerado peça principal da objetividade, mas ela vai além da pirâmide invertida, todos os elementos presentes fazem parte e precisam tem o mesmo rigor cientifico quando produzidos.
Sempre que se fala em objetividade, tem-se em mente apenas o texto, ignorando-se não apenas o processo de seleção das informações ali contidas, mas o fato de que um jornal é um conjunto elementos verbais e não-verbais que interagem na produção de sentido. Assim, nada se diz sobre a “objetividade” de fotos e ilustrações, muito menos da edição. Ressalte-se que essas observações dizem respeito ao jornalismo impresso, pois quando se considera o noticiário de rádio e TV é inevitável levar em conta os recursos e efeitos sonoros, a entonação de repórteres e locutores e, no caso da televisão, também gestos e expressão facial. (MORETZSOHN, 2002, p.80)
2.3 Reflexos da Subjetividade no Jornalismo
2.3.1 Angulação
É o ato de escolher uma abordagem, uma palavra, uma imagem, fazendo o texto seguir um caminho diferente e obtendo outro efeito.
Existe o jornalista que só conta o fato: um muro caiu na cabeça da dona Maria e ela morreu de debaixo de 35 tijolos. Isto é um fato, puro e simples. Haverá outro jornalista que dirá que o muro caiu porque o dono do terreno se recusou a gastar dinheiro e usou um suporte ruim, que ameaçava cair. (ABRAMO, 1988, p.110)
Cláudio Abramo mostra-nos neste exemplo como a angulação é um exemplo de subjetividade, na primeira frase do exemplo dele, descreveu-se o fato como um jornalista contará, posteriormente, mostrou-se outro jornalista que abordou o mesmo fato de outra maneira, para isto o jornalista usou de suas características, citadas por Felipe Pena e Wilson da Costa Bueno, para abordar o fato da maneira diferente, mesmo ambos tendo seguido a técnica do jornalismo objetivo, tendo o texto objetivo, mas a subjetividade implícita do segundo jornalista fez olhar o fato por outro ponto de vista.
No geral, as notícias sobre a Rússia se convertiam num caso de ver as coisas não como eram, mas como os homens queriam ver. (KOVACH e ROSENSTIEL, 2003, p.114)
A angulação pode também ser nociva aos princípios éticos, segundo palavras de Walter Lippmann, extraídas da citação acima, com a análise da cobertura do jornal norte-americano The New York Times sobre a Revolução Russa, em que as noticias não mostravam os fatos como aconteceram, mas sim da maneira que os homens do poder queriam apontar para a sociedade. Mesmo com o uso da técnica, o jornalismo está ainda nas mãos da subjetividade.
2.3.2 Notícias x Opinião
No primeiro capítulo mostramos foi preciso separar as notícias da opinião para encontrar o jornalismo objetivo, tendo este conceito criado, segundo MORETZSOHN (2002, p.110) pelo editor do jornal inglês The Daily Courant, Samuel Buckley, separando as notícias dos artigos, para não contaminar as informações.
Conceitos que iludem os leitores, como esse de levá-los a acreditar que a paginação diferenciada dos artigos garantem notícias com informação purificada, livre de pontos de vista, produzida pela devoção a objetividade. (...) trata-se de um falso paradigma, porque o jornalismo não se divide, mas se constrói com informações e opiniões (CHAPARRO, 1998, p.97)
2.4 O Ritual da Objetividade
Assim como toda técnica, a objetividade necessita de procedimentos (ligação com a teoria do Newsmaking) para ser exercida. Os jornalistas, segundo TUCHMAN, em seu artigo A Objetividade Como Ritual Estratégico, mencionado por TRAQUINA (1993), utilizam este ritual da técnica para se protegerem dos riscos de sua profissão, tais como processos, criticas, acusações.
Alguns procedimentos estratégicos são seguidos pelos jornalistas. O jornalista tem que ser capaz de identificar o fato jornalístico, o senso comum, conhecido como faro jornalístico.
O senso comum desempenha papel importante na avaliação do conteúdo noticioso, uma vez que o conteúdo de uma notícia é composto de numerosos fatos, e o senso comum determina se uma informação pode ser aceita como “fato”. Fatos que jornalistas aceitam como provados revelam até que ponto é que o news judgement se pode basear no senso comum. (TUCHMAN in TRAQUINA, 1993)
A obtenção de provas faz parte do procedimento, vídeos, documentos e outras provas sempre são evidenciadas em matérias investigativas.
AUTHIER-REVUZ (1990) mostra que o recurso das aspas garante ao texto a veracidade de uma informação objetiva, e ao mesmo tempo livra o jornalista da responsabilidade de tal fato. MORETZSOHN (2002) conceitua que o uso das aspas é uma questão que vai além da responsabilidade do jornalista, trata-se em dizer através do outro, sobre o que o jornal não pode assumir, sob pena de perder seu lugar de autoridade e credibilidade. PENA (2006) afirma que esse recurso faz os jornais valorizarem mais as declarações do que os próprios fatos.
A estrutura do texto trazendo as informações em uma sequencia faz parte do ritual do jornalista. Esse procedimento é estruturado com a pirâmide invertida, que consiste em lead, sub lead e corpo da notícia. As informações mais relevantes a um acontecimento são apresentadas no primeiro parágrafo, o lead, e os complementos da notícia são colocados depois de respondidas as seis perguntas básicas do jornalismo: quem, quando, o que, por quê, como e onde.
2.5 Ligação da Objetividade com outras teorias
2.5.1 Teoria do Espelho
A Teoria do Espelho consiste na retratação da realidade, sem nenhum tipo de alteração, são os fatos mostrados como são, fazendo analogia com o espelho, que é o reflexo da realidade.
PENA (2006) mostra que a teoria do espelho é limitada, pois os jornalistas fazem escolhas, sempre subjetivas, durante todo o processo da notícia: pautas, fontes, escolha das palavras para compor o texto e o enfoque a ser dado na informação.
2.5.2 Teoria do Gatekeeper
A teoria do Gatekeeper (porteiro, tradução do inglês) que no caso, esse porteiro é o jornalista editor, que escolhe por critérios subjetivos quais as notícias serão publicadas.
PENA (2006) afirma que as decisões dos jornalistas gatekeepers são subjetivas, arbitrárias e com juízo de valor baseados no conjunto de experiências, atitudes e expectativas do jornalista.
3. Considerações finais
A Teoria da Objetividade Jornalística é uma das teorias mais discutidas e polêmicas entre os estudiosos e profissionais da comunicação.
Pelas pesquisas realizadas e entrevistas, todos afirmam que a objetividade jornalística é um mito. O jornalismo, assim como o jornalista, são subjetivos. Essa subjetividade está presente em todos os processos da notícia, desde o recebimento na redação até a publicação.
A objetividade usa de métodos para amenizar a subjetividade que está presente em seus meios e processos, alguns desses métodos passam a responsabilidade de fatos para terceiros, isentando o jornalista e evitando os riscos de sua profissão, como uma ferramenta para um trabalho bem feito, sem críticas e processos.
Encontramos nos produtos jornalísticos a separação entre notícia e opinião, levando a crer que só encontramos pontos de vista nos textos opinativos e reflexivos, algo que é ilusório, pois todos os produtos jornalísticos estão repletos de subjetividade, como foi mostrado no estudo acima.
Observamos em alguns casos a dimensão que um comentário ou opinião pode exercer sobre um fato, tendo o impacto positivo ou negativo, dependendo do ponto de vista do articulista e assim virando um ponto de vista comum para os leitores. As opiniões dos midiáticos conduzem o público a ter o mesmo ponto de vista deles.
As teorias que estudam o jornalismo estão interligadas, é impossível mencionar apenas uma, ou entende-la isoladamente, é preciso ter o conhecimento e entendimento de todas para compreender e discutir as diversas teorias que envolvem o jornalismo.
Todos os autores citados não mediram esforços na tentativa de clarear o significado da objetividade no jornalismo. Junto-me a eles por acreditar que esse esforço é fundamental não só para melhorar a imagem da profissão perante a sociedade, mas para o entendimento dos jornalistas sobre o próprio ofício. (PENA, 2006, p. 52)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PENA, Felipe. Teoria do Jornalismo. 2. Ed. São Paulo: Contexto, 2006.
MORETZSOHN, Sylvia. Jornalismo em “tempo real”: O fetiche da velocidade. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
MINDICH, David. Just the facts: how objectivity came to define americam journalism. New York: New York University Press, 1998.
ABRAMO, Claúdio. A regra do jogo. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
KOVACH, Bill; ROSENTIEL, Tom. Os elementos do jornalismo. São Paulo: Geração, 2003.
CHAPARRO, Manuel. Sotaque d’aquém e d’além mar: percursos e gêneros do jornalismo português e brasileiro. Santarém: Jortejo Edições, 1998.
TUCHMAN, Gaye. A objectividade como ritual estratégico: uma análise das noções de objectividade dos jornalistas. In TRAQUINA, Nelson (org.). Jornalismo: Questões, teorias, estórias. Lisboa: Veja, 1993
AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Heterogeneidade(s) enunciativa(s). Campinas: Unicamp, 1990.
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